Colaborador - Ivan Horcaio

10-03-2020 16h24

As Disciplinas Jurídicas (Parte 1)

Os avançados estudos que se desenvolvem sobre o Direito, na atualidade, diversificam-se em vários planos de pesquisa que, no conjunto, favorecem a ampla compreensão do fenômeno jurídico. Ao ser objeto de estudo de diferentes disciplinas afins, mais frequentemente denominadas ciências jurídicas, o Direito não perde a sua unidade fundamental. 

Apesar dos enfoques unilaterais, a ação totalizante do espírito alcança o fenômeno jurídico em sua composição integral, em sua completude. As disciplinas jurídicas dividem-se em duas classes: as fundamentais e as auxiliares. A Ciência do Direito, Filosofia do Direito e Sociologia do Direito, integram o primeiro grupo, enquanto a História do Direito e o Direito Comparado, entre outras, compõem o segundo.

Se o conhecimento do Direito se faz através de cada uma dessas disciplinas, que abrem, cada qual, uma perspectiva própria de estudo, capaz de motivar intensamente o espírito, é indispensável uma orientação inicial aos que visam a alcançar o conhecimento sistemático do Direito: a compreensão plena de nossa ciência exige o conhecimento anterior do homem e da sociedade. Em nenhum momento do estudo do Direito se poderá fazer abstração destes dois agentes, pois as normas jurídicas são estabelecidas de acordo com a natureza humana, em função de seus interesses, e sofrem ainda a influência das condições culturais, morais e econômicas do meio social. Esta mesma linha de pensamento é apresentada por Michel Virally, para quem “o Direito descansa sempre sobre uma determinada concepção do homem e da sociedade, de suas relações recíprocas e, por conseguinte, também sobre um determinado sistema de valores”.

Há mais de um século e meio Ferrer já enfatizava a importância do estudo da natureza humana para o conhecimento do Direito: “... debalde se procurará a razão dos princípios do Direito, sem primeiro se ter estudado a natureza do ser, que tem direitos.”

O conhecimento da vida humana, por seu lado, pressupõe experiência e reflexão filosófica, enquanto os dados referentes à realidade social são fornecidos pela Sociologia. A análise do homem e da sociedade deve ser uma tarefa permanente a ser desenvolvida pelo estudioso do Direito.

3.1. Disciplinas jurídicas fundamentais

3.1.1. Ciência do Direito

Também chamada Dogmática Jurídica, esta disciplina aborda o Direito vigente em determinada sociedade e as questões relativas à sua interpretação e aplicação. O seu papel é revelar o ser do Direito, aquele que é obrigatório, que se acha posto à coletividade e se localiza, basicamente, nas leis e nos códigos. 

Não é de natureza crítica, isto é, não penetra no plano de discussão quanto à conveniência social das normas jurídicas. Ao operar no plano da Ciência do Direito, o cientista tão somente cogita dos juízos de constatação, a fim de apurar as determinações contidas no conjunto normativo. É irrelevante, nesse momento, qualquer consideração sobre o valor justiça, pois a disciplina se mantém alheia aos valores. 

Cumpre apenas, à Ciência do Direito, definir e sistematizar o conjunto de normas que o Estado impõe à sociedade. É irrecusável a importância desta disciplina para a organização da vida jurídica, mas, pergunta-se, o seu estudo é suficiente? Enquanto os positivistas respondem afirmativamente à indagação, fiéis à sua concepção legalista do Direito, os jusnaturalistas negam suficiência à disciplina, de vez que se preocupam com a justiça substancial e com o Direito Natural.

A visão que a Ciência do Direito oferece é limitada, fenomênica, não suficiente para revelar ao espírito o conhecimento integral do Direito, cuja majestade não decorre apenas das leis, mas do seu significado, da importância de sua função social, dos valores espirituais que consagra e imprime às relações interindividuais.

Observe-se, finalmente, que a expressão Ciência do Direito, além de ser empregada em sentido restrito, como uma das disciplinas jurídicas, é usada em sentido amplo, como referência à totalidade dos estudos desenvolvidos sobre o Direito.

3.1.2. Filosofia do Direito

Enquanto a Ciência do Direito se limita a descrever e sistematizar o Direito vigente, a Filosofia do Direito transcende o plano meramente normativo, para questionar o critério de justiça adotado nas normas jurídicas. De um lado, a Ciência do Direito responde à indagação Quid juris? (o que é de Direito?); de outro, a Filosofia Jurídica atende à pergunta Quid jus? (o que é o Direito?).

Esta é uma disciplina de reflexão sobre os fundamentos do Direito. É a própria Filosofia Geral aplicada ao objeto Direito. Preocupado com o dever ser, com o melhor Direito, com o Direito justo, é indispensável que o jusfilósofo conheça tanto a natureza humana quanto o teor das leis. Basicamente o objeto da Filosofia do Direito envolve uma pesquisa lógica, pela qual se investiga o conceito do Direito em seus aspectos mais variados e complexos, e outra de natureza axiológica que desenvolve a crítica às instituições jurídicas, sob a ótica dos valores justiça e segurança.

Além do conhecimento científico do Direito, que oferece a noção sistemática da ordem jurídica, e do filosófico, que vê esse ordenamento em função do conjunto dos interesses humanos, a fim de harmonizar a ordem jurídica com a ordem geral da vida e das coisas, há o chamado conhecimento vulgar, que é elementar, fragmentário e resulta da experiência. Enquanto os conhecimentos científico e filosófico do Direito se obtêm pela seleção e emprego de métodos adequados de pesquisa, o vulgar é adquirido pela vivência e participação na dinâmica social. É a noção que o leigo possui, oriunda de leitura assistemática ou de simples informações.


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