Colaborador - Ivan Horcaio

03-03-2020 12h57

Direito do Consumidor - Disposições Gerais (Parte 2)

Art 2 - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

O conceito de consumidor passa pela definição disposta no presente artigo, segundo  qual, consumidor "é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Sendo assim, são três os elementos que compõem o conceito de consumidor segundo a redação supracitada. O primeiro deles é o subjetivo, (pessoa física ou jurídica), o segundo é o objetivo (aquisição ou utilização de produtos ou serviços) e o terceiro e último é o teleológico (a finalidade pretendida com a aquisição de produto ou serviço) caracterizado pela expressão destinatário final.
Interessante observar que não é consumidor apenas quem adquire, mas também quem utiliza (por exemplo, um familiar do adquirente ou quem ganhou de presente um produto).

A definição estampada no caput do referido artigo é denominada pela doutrina de "consumidor stricto sensu ou standard, em contraposição aos consumidores equiparados definidos no parágrafo único  e nos artigo. 17 e 29.

De acordo com o caput do artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor - CDC, a única característica restritiva para se alcançar o conceito de consumidor seria a aquisição ou utilização do bem como destinatário final.

Como o texto legal não responde o que significa destinatário final, a solução é buscar
o auxílio da doutrina, para, assim, definir o conceito de consumidor. Na doutrina consumerista, duas correntes se forjaram a respeito do tema. São denominadas de finalistas e maximalistas.

A doutrina finalista (ou subjetiva), partindo do conceito econômico de consumidor, propõe que a interpretação da expressão destinatário final seja restrita, fundamentando- se no fato de que somente o consumidor, parte mais vulnerável na relação contratual, merece a especial tutela.

Assim, consumidor seria o não profissional, ou seja, aquele que adquire ou utiliza um produto para uso próprio ou de sua família.

Para a doutrina finalista, o destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta interpretação teleológica não basta o destinatário fático do produto, retirá-lo da cadeia de produção, levá-lo para o escritório ou residência, é necessário ser destinatário final econômico do bem, não adquiri-lo para revenda, não adquiri-lo para o uso profissional, pois o bem seria novamente um instrumento de produção cujo preço será incluído no preço final do profissional que o adquiriu. Neste caso não haveria a exigida destinação final do produto ou serviço.

Em outras palavras, o destinatário final é o que retira o bem do mercado ao adquirir
ou simplesmente utilizá-lo (destinatário final fático), é aquele que coloca um fim na cadeia de produção {destinatário final econômico), e não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir, pois ele não é o consumidor final, já que está transformando e utilizando o bem para oferecê-lo, por sua vez, ao cliente, consumidor do produto ou serviço.

Analisando a doutrina finalista sob o enfoque da necessidade de se dar uma destinação econômica ao produto ou serviço, percebe-se que, em principio, praticamente se inviabiliza o reconhecimento da pessoa jurídica como consumidora. Isso porque, em menor ou maior escala, os produtos e serviços adquiridos são, ainda que indiretamente, utilizados na atividade lucrativa.

Como o CDC foi claro ao dispor sobre a possibilidade da pessoa jurídica ser considerada consumidora, a doutrina finalista começa a diferenciar quando o produto ou serviço é utilizado como insumo da produção. Dessa forma, sendo o produto utilizado como matéria prima ou o serviço utilizado como parte do processo produtivo, a pessoa jurídica não seria considerada consumidora. Mas, caso o produto ou o serviço não fossem insumos, ela poderia ser considerada consumidora. Nesse sentido, quando uma fábrica têxtil adquire algodão, ela não pode ser considerada consumidora, pois está adquirindo insumo, matéria prima a ser utilizada no processo produtivo. Presume-se, nesses casos, que a pessoa jurídica conhece bem o produto ou o serviço que está adquirindo, não havendo desequilíbrio na relação contratual.

Agora, quando a mesma fábrica têxtil adquire veículo para transporte de seus funcionários, ou contrata serviço de segurança ou de limpeza, por não serem produtos ou serviços utilizados diretamente no processo produtivo, poderia ser considerada consumidora.

Já para a corrente maximalista (ou objetiva), com base no conceito jurídico de consumidor, o CDC é visto de uma maneira bem mais ampla, abrangendo maior número de relações, pelas quais as normas inseridas nesse diploma devem regular a sociedade de consumo como um todo.

Para a teoria maximalista, o destinatário final seria somente o destinatário fático, pouco importando a destinação econômica que lhe deva sofrer o bem.

Para alguns, os maximalistas veem nas normas do CDC o novo regulamento do mercado de consumo brasileiro, e não normas orientadas para proteger somente o consumidor não profissional. O CDC seria um código geral sobre o consumo, um código para a sociedade de consumo, o qual institui normas e princípios para todos os agentes do
mercado, os quais podem assumir os papéis ora de fornecedores ora de consumidores. 

Nesse caso, a definição do artigo 2° deve ser interpretada o mais extensamente possível, para que as normas do CDC possam ser aplicadas a um número cada vez maior de relações no mercado. Consideram que a definição do art. 2° é puramente objetiva, não importando se a pessoa física ou jurídica tem ou não fim de lucro quando adquire um produto ou utiliza um serviço. 

Destinatário final, então, seria o destinatário fático do produto, aquele que retira do mercado e o utiliza, o consome, por exemplo, a fábrica de celulose, que compra carros para o transporte dos visitantes, o advogado que compra uma máquina de escrever para o seu escritório.

Assim, para os maximalistas, a definição de consumidor é puramente objetiva, não importando a finalidade da aquisição ou do uso do produto ou serviço, podendo até mesmo haver intenção de lucro.

Para os finalistas, o agigantamento do universo de aplicação do CDC acarretaria o desprestígio do fim especial visado pelo legislador, reforçando, em contrapartida, a tutela dos profissionais que, quando eventualmente atuassem como consumidores, possuiriam privilégios especiais excedentes às do direito comum.

Segundo alguns, para a exata definição de consumidor e delimitação de abrangência de aplicação do CDC nas relações contratuais, seria necessário fazer uma interpretação teleológica da regra do artigo 2° com o sistema tutelar consumerista, buscando a ratio principal da norma. Para tanto, de acordo com a autora, destinatário final, para efeitos de definição do conceito de consumidor, seria somente aquele que, segundo o artigo 4º, fosse reconhecido como "vulnerável" numa relação contratual, pois somente esses merecem receber a tutela especial do CDC.
 


Direito do Consumidor - Disposições Gerais (Parte 1)

Direito do Consumidor - Disposições Gerais (Parte 3)

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