Decreto-lei 781, de 12 de outubro de 1938
Regula a comunhão de interesses entre portadores de debentures.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando da atribuição que lhe confere o art. 180 da Constituição,
DECRETA:
Art. 1º – Os empréstimos por obrigações ao portador (debentures) contraídos pelas sociedades anônimas, ou em comandita por ações, ou pelas autorizadas por leis especiais, criarão, quando tal condição constar do manifesto da sociedade e do contrato devidamente inscrito, uma comunhão de interesses entre os portadores dos títulos da mesma categoria, a saber, emitidos com fundamento no mesmo ato, subordinados às mesmas condições de amortização e juros, e gozando das mesmas garantias.
Art. 2º – Os atos relativos ao exercício dos direitos fundados nos contratos desses empréstimos ou nos títulos emitidos em virtude deles e cujos efeitos se estendam à coletividade dos seus portadores, ficam reservados às deliberações das Assembleias Gerais desses portadores (obrigacionistas) ou aos representantes por elas anteriormente designados; excluídas as ações individuais, salvo as exceções expressamente consignadas nesta lei.
Essas assembleias serão constituídas unicamente pelos portadores dos títulos da mesma categoria, e as suas deliberações não terão força obrigatória senão para esses portadores.
Art. 3º – Podem ser objeto das deliberações da assembleia, regularmente convocada e constituída:
1º – todas as medidas de conservação, defesa o salvaguarda dos interesses comuns dos obrigacionistas;
2º – quaisquer modificações temporárias ou definitivas das cláusulas e estipulações do contrato de empréstimo, tais como:
a) suspensão, por prazo determinado, do pagamento dos juros e das amortizações anuais das obrigações emitidas, mediante incorporação desses juros ao capital do empréstimo, e aumento correlativo do valor de cada obrigação, ou emissão de novos títulos de valor correspondente à importância dos juros e das amortizações suspensas, amortizáveis em prazo determinado e vencendo ou não juros, ou dando apenas direito a juros variáveis, cumulativos ou não;
b) prorrogação do prazo de amortização do empréstimo;
c) substituição da amortização por sorteios pelo resgate dos títulos mediante compra em Bolsa;
d) supressão do prêmio das obrigações cujo reembolso se tenha contratado com tal vantagem;
e) substituição do pagamento dos juros fixos estipulados pelo de juros variáveis, cumulativos ou não;
f) redução da taxa de juros e do valor de cada obrigação;
g) novação, por substituição do devedor, em consequência de fusão ou incorporação da sociedade devedora a outra que assuma a responsabilidade da dívida;
3º – a nomeação de um ou mais representantes, permanente ou não, da coletividade dos obrigacionistas, com a incumbência de tomar, de sua própria iniciativa, as providências que as circunstancias aconselharem, em bem dos interesses comuns, ou com delegação especial para praticar atos especificados no mandato conferido, inclusive intentar quaisquer processos, requerer a falência da sociedade ou representar a comunhão no processo de falência.
Art. 4º – A convocação da assembleia cabe à sociedade devedora sempre que aos seus administradores parecer necessário, mas deve ainda ser feita quando solicitada por escrito, e declarado o motivo e o objeto da convocação, por obrigacionistas que representem a vigésima parte do valor dos títulos em circulação, ou pelo representante dos obrigacionistas, nomeado em assembleia anteriormente realizada. Si a convocação não for feita dentro de 5 dias da data da apresentação do pedido, aos interessados é facultado requerê-la ao juiz de direito da comarca da sede respectiva, o qual, ouvida a sociedade, que terá o encargo das custas, poderá, por despacho, autorizar a convocação direta.
O pedido de convocação deverá ser sempre instruído com o certificado ou conhecimento de depósito dos títulos respectivos, feito no Banco do Brasil, ou em suas agências, ou, com o visto do fiscal respectivo, em qualquer outro estabelecimento bancário.
Art. 5º – Reunir-se-á, a assembleia no lugar em que tiver sede a sociedade. quinze dias, pelo menos, após a data da primeira publicação do anúncio de convocação.
O anúncio designará o dia, o local e a hora da reunião, o objeto das deliberações, os estabelecimentos em que deverão os obrigacionistas efetuar o depósito dos títulos com que legitimam a sua qualidade, e, si a convocação se fundar em autorização judicial, mencionará este fato, com as indicações necessárias à sua verificação.
A publicação far-se-á por duas vezes no "Diário Oficial" ou na folha que, na sede da sociedade, for encarregada das publicações oficiais, e outras tantas em dois jornais dos de maior circulação no lugar em que a assembleia deva reunir-se.
Art. 6º – Quando a assembleia for convocada pela sociedade, presidi-la-á o seu presidente, ou administrador por ela designado; quando convocada pelo representante dos obrigacionistas, este representante; quando por obrigacionistas, o obrigacionista designado pelo juiz no despacho que autorizar a convocação. O presidente será assistido de dois secretários, que serão os dois maiores portadores de títulos que assistirem à reunião e aceitarem a incumbência.
Art. 7º – Os nomes e domicílios dos obrigacionistas presentes, ou dos seus representantes, com a indicação exata, por extenso, do número de obrigações de cada um, serão por eles lançados numa folha de presença, que será rubricada pelo presidente da assembleia e poderá ser examinada no ato por qualquer dos obrigacionistas presentes.
Essa lista deverá ser conferida com os certificados do depósito efetuado de conformidade com esta lei, as quais serão exibidos e verificados no ato.
Parágrafo único. A sociedade, que em todos os casos terá direito de comparecer à reunião, é obrigada a fornecer um certificado subscrito por seu presidente, com a indicação do número dos títulos em circulação.
Art. 8º – Das deliberações e ocorrências se lavrará ata circunstanciada, subscrita pelo presidente e secretários, por mais dois obrigacionistas presentes e pelo representante da saciedade devedora, se esta tiver comparecido à assembleia.
Parágrafo único. As atas reconhecidas as firmas por tabelião, a falha de presença, as procurações e os exemplares dos jornais que tiverem publicado o anúncio, arquivar-se-ão juntamente no registo. onde, de acordo com a lei, se tiver feito a inscrição do empréstimo (art. 5º, letra a, n. VI, da lei n. 4.827, de 7 de fevereiro de 1924).
Art. 9º – As deliberações serão tomadas pela maioria das obrigações representadas na assembleia, salvo os casos especiais em que a lei exigir maioria especial.
Só são admitidos a votar os obrigacionistas que tiverem legitimado a sua qualidade com o depósito dos títulos de sua propriedade, pelo menos dois dias antes da data marcada para a reunião.
Os obrigacionistas ausentes poderão fazer-se representar por terceiros, sejam estes obrigacionistas, ou não, cada obrigação dará direito a um voto.
Art. 10. Se na primeira reunião não houver número, marcar-se-á a segunda, com intervalo de 3 dias. Se na terceira reunião, após o mesmo intervalo, não for conseguido o número de portadores necessário para o acordo, entender-se-á que os obrigacionistas recusam formular ou aceitar proposta de acordo.
Art. 11. O acordo, no caso da comunhão dos debenturistas, somente será válido se for aceito por portadores que representem no mínimo 2/3 do valor total das obrigações emitidas e por acionistas que representem, no mínimo. 2/3 do capital social.
Art. 12. As deliberações, que alteram cláusulas de contrato de empréstimo deverão sempre ter o apoio de pelo menos 2/3 das obrigações em circulação e dependem, para se tornar obrigatórias de homologação Judicial, que não seja negada se todas as formalidades e condições impostas na lei tiverem sido observadas, ouvidos previamente o representante do ministério público e, se o requerer ou o juiz julgar necessário, um representante dos debenturistas divergentes.
Parágrafo único. A homologação processar-se-á de acordo com o disposto quanto à da concordata (decreto n. 5.746, de 9 de dezembro de 1929).
Art. 13. Quando a assembleia se reunir, por convocação da sociedade, para deliberar sobre proposta de modificação das cláusulas e estipulações do contrato de empréstimo, a proposta devera ser acompanhada , pena de nulidade da deliberação. de uma exportação justificativa com a afirmação expressa, subscrita pela diretoria, ou pelos responsáveis, da veracidade das informações prestadas, e de parecer de dois peritos contadores que atestem a exatidão e fidelidade destas informações, em vista do exame da escrita e dos documentos que entenderem necessários para firmar o seu juízo.
Parágrafo único. Qualquer acordo para liquidação de empréstimo por obrigações (debentures) deverá corresponder a um pagamento não inferior ao que produziria, para os obrigacionistas, a liquidação da sociedade, deduzidas as despesas previstas da operação e o valor das dívidas privilegiadas por lei.
Art. 14. Os portadores designarão, por maioria dos presentes na reunião em que propuserem o acordo, ou na destinada a aprovar a proposta oferecida pela sociedade, um fiscal que, em seu nome, colabore com a diretoria ou liquidantes, na execução do acordo e que vigie por seus direitos e interesses.
Art. 15. O acordo, ainda que julgado por sentença, poderá ser desfeito ou rescindido, provando-se nulidade, fraude, simulação ou erro, por ação promovida dentro de um ano da sua data ou, quando for o caso, da homologação.
Art. 16. No caso de achar-se a sociedade em falência, logo após a verificação dos créditos, o acordo juntar-se-á aos autos respectivos para o fim de ser julgado por sentença.
Art. 17. Correm por conta da sociedade devedora todas as despesas de convocação das assembleias, com o depósito dos títulos e arquivamento das atas, e mais custas, no caso previsto no art. 4º
Art. 18. Em caso de impontualidade no pagamento dos juros e no reembolso das obrigações sorteadas, quando tal for o modo de amortização convencionado e ainda que no regime de comunhão, poderá qualquer obrigacionista demandar o seu pagamento ou requerer a falência da sociedade devedora se, dentro do prazo de 60 dias da data em que a impontualidade se verificar, não tiver sido convocada, pela sociedade devedora, ou pelos obrigacionistas, ou ainda pelo representante destes, já anteriormente nomeado, a assembleia dos obrigacionistas, que deverá deliberar sobre a providência mais conveniente aos interesses comuns.
Esta disposição não compreende, porem, a hipótese em que a falta do pagamento for ato de ordem individual, que não interesse a coletividade dos obrigacionistas, caso em que a ação individual é admitida sem restrições.
Art. 19. Na falência da sociedade devedora, a representação e defesa dos direitos dos obrigacionistas da mesma categoria, com comunhão de interesses, compete ao obrigacionista que for ou tiver sido eleito para este fim pela assembleia geral.
Para este fim, deverão os obrigacionistas fazer o depósito dos seus títulos na forma prevista no art. 4º, remetendo uma duplicata do certificado de depósito ao representante designado.
Art. 20. No que diz respeito aos empréstimos por obrigações ao portador, contraídos no estrangeiro por sociedades nacionais, aplicar-se-ão, quanto à representação coletiva, a lei sob a qual foi o contrato celebrado e as convenções entre as partes sobre a matéria.
Art. 21. Para o efeito da constituição de quórum a que se refere esta lei são sempre excluídas do número das obrigações em circulação as pertencentes à sociedade.
Art. 22. Esta lei entrará em vigor trinta dias depois de sua publicação; revogadas as disposições em contrário.
Rio de Janeiro, 12 de outubro de 1938, 117º da Independência e 50º da República.
GETÚLIO VARGAS
A. de Souza Costa
Francisco Campos