A cessão de direitos é uma figura jurídica prevista no Direito Civil brasileiro, regulada principalmente pelos artigos 286 a 298 do Código Civil. Trata-se de um contrato mediante o qual o titular de um direito (cedente) transfere, total ou parcialmente, a titularidade desse direito para um terceiro (cessionário). A cessão de direitos pode incidir sobre créditos, direitos patrimoniais ou obrigações. A seguir, analisa-se seus principais aspectos jurídicos e fundamentos.
Art. 286 – O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação.
Art. 287 – Salvo disposição em contrário, na cessão de um crédito abrangem-se todos os seus acessórios.
Art. 288 – É ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do § 1 o do art. 654.
Art. 289 – O cessionário de crédito hipotecário tem o direito de fazer averbar a cessão no registro do imóvel.
Art. 290 – A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.
Art. 291 – Ocorrendo várias cessões do mesmo crédito, prevalece a que se completar com a tradição do título do crédito cedido.
Art. 292 – Fica desobrigado o devedor que, antes de ter conhecimento da cessão, paga ao credor primitivo, ou que, no caso de mais de uma cessão notificada, paga ao cessionário que lhe apresenta, com o título de cessão, o da obrigação cedida; quando o crédito constar de escritura pública, prevalecerá a prioridade da notificação.
Art. 293 – Independentemente do conhecimento da cessão pelo devedor, pode o cessionário exercer os atos conservatórios do direito cedido.
Art. 294 – O devedor pode opor ao cessionário as exceções que lhe competirem, bem como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha contra o cedente.
Art. 295 – Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que não se responsabilize, fica responsável ao cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lhe cedeu; a mesma responsabilidade lhe cabe nas cessões por título gratuito, se tiver procedido de má-fé.
Art. 296 – Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor.
Art. 297 – O cedente, responsável ao cessionário pela solvência do devedor, não responde por mais do que daquele recebeu, com os respectivos juros; mas tem de ressarcir-lhe as despesas da cessão e as que o cessionário houver feito com a cobrança.
Art. 298 – O crédito, uma vez penhorado, não pode mais ser transferido pelo credor que tiver conhecimento da penhora; mas o devedor que o pagar, não tendo notificação dela, fica exonerado, subsistindo somente contra o credor os direitos de terceiro.
1. Natureza Jurídica da Cessão de Direitos
A cessão de direitos é um contrato bilateral, pois exige a manifestação de vontade de duas partes: o cedente e o cessionário. Pode ser onerosa ou gratuita, dependendo da natureza do acordo entre as partes. Quando onerosa, implica o pagamento de uma contraprestação pelo cessionário, ao passo que, quando gratuita, é feita sem pagamento, caracterizando-se por uma doação.
A cessão de direitos também se enquadra como um negócio jurídico translativo, visto que há a transferência da titularidade de um direito de uma pessoa para outra. Esse direito pode ser oriundo de diversos tipos de relações jurídicas, como contratos de compra e venda, empréstimos ou contratos de locação.
2. Requisitos e Validade
A cessão de direitos, como qualquer contrato, deve observar os requisitos gerais dos negócios jurídicos, ou seja, agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não vedada por lei (artigo 104 do Código Civil).
Art. 104 – A validade do negócio jurídico requer:
I – agente capaz;
II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III – forma prescrita ou não defesa em lei.
Ademais, a cessão de direitos pode ser pactuada por meio de um instrumento particular ou público, dependendo da natureza do direito cedido. Em casos em que o direito cedido envolve bens imóveis, a cessão deve ser feita por escritura pública, conforme exigência do artigo 108 do Código Civil.
Art. 108 – Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
A validade da cessão também depende da sua notificação ao devedor (no caso de cessão de créditos), prevista no artigo 290 do Código Civil. Até que essa notificação ocorra, o devedor pode legitimamente pagar ao cedente, extinguindo sua obrigação, o que garante a segurança jurídica do devedor.
Art. 290 – A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.
3. Cessão de Créditos
Um dos aspectos mais comuns da cessão de direitos é a cessão de créditos. Esta ocorre quando o cedente transfere a um terceiro o direito de receber uma quantia ou uma prestação a que teria direito.
Nos termos do artigo 286 do Código Civil, “o credor pode ceder seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei ou a convenção com o devedor”. Assim, em regra, o crédito é cedível, exceto nos casos em que a obrigação tenha caráter pessoal, ou quando haja cláusula contratual de inalienabilidade.
3.1. Direitos e Obrigações das Partes na Cessão de Créditos
– Cedente: garante a existência do crédito no momento da cessão, salvo se pactuado o contrário. No entanto, ele não é responsável pela solvência do devedor, a menos que tenha expressamente assumido essa responsabilidade;
– Cessionário: ao receber o crédito, sub-roga-se em todos os direitos do cedente, podendo cobrar o devedor, propor ações judiciais e receber o pagamento;
– Devedor: deve ser notificado da cessão. Se a cessão for a título oneroso, o devedor pode opor ao cessionário as mesmas exceções que poderia opor ao cedente (art. 294 do Código Civil).
Art. 299 – É facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consentimento expresso do credor, ficando exonerado o devedor primitivo, salvo se aquele, ao tempo da assunção, era insolvente e o credor o ignorava.
Parágrafo único. Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa.
4. Cessão de Direitos Contratuais
A cessão pode recair não apenas sobre créditos, mas também sobre direitos contratuais. Nesses casos, o cedente transfere ao cessionário sua posição em um contrato, podendo implicar tanto direitos quanto obrigações.
Por exemplo, em um contrato de compra e venda, o comprador pode ceder seu direito de adquirir o bem a outra pessoa, desde que a cessão seja permitida pelo contrato original ou que não haja impedimentos legais. Nesse caso, a cessão de direitos contratuais pode incluir tanto a transferência do direito de exigir o cumprimento da obrigação quanto a assunção de eventuais encargos ou responsabilidades previstas no contrato.
5. Cessão de Direitos Hereditários
Outro campo importante da cessão é o de direitos hereditários. Antes da partilha, os herdeiros podem ceder seus direitos sobre a herança, total ou parcialmente, conforme o disposto no artigo 1.793 do Código Civil. A cessão de direitos hereditários exige escritura pública se envolver bens imóveis, ou documento escrito quando se trata de bens móveis.
Uma questão relevante nesse tipo de cessão é que, até a partilha dos bens, o objeto da cessão é considerado indeterminado, o que implica que o cessionário não adquire imediatamente o bem cedido, mas sim a expectativa de direito à parte da herança que caberia ao cedente.
6. Limitações à Cessão de Direitos
Existem limitações legais e contratuais à cessão de direitos. A principal limitação decorre do caráter personalíssimo de certos direitos, como os direitos relacionados à personalidade (direito à imagem, à honra, etc.), que são intransferíveis. Além disso, contratos podem conter cláusulas de inalienabilidade, impedindo a cessão dos direitos.
Outra limitação é a necessidade de consentimento do devedor em certos casos, como a cessão de direitos e obrigações em contratos em que a identidade do credor ou do devedor seja relevante para a relação contratual.
7. Aspectos Processuais
No campo processual, a cessão de direitos também produz efeitos importantes. Quando ocorre a cessão de crédito no curso de uma ação judicial, por exemplo, o cessionário pode suceder o cedente no polo ativo da demanda, conforme o artigo 109 do Código de Processo Civil. No entanto, essa sucessão só se concretiza se houver a aceitação do devedor ou uma decisão judicial que a autorize, garantindo-se a segurança processual.
Conclusão
A cessão de direitos é uma figura jurídica que desempenha papel relevante no âmbito patrimonial, sendo amplamente utilizada em transações comerciais e civis. Sua regulamentação no Código Civil brasileiro garante flexibilidade nas operações jurídicas, ao mesmo tempo em que oferece segurança às partes envolvidas, especialmente ao estabelecer requisitos formais e a necessidade de notificação ao devedor na cessão de créditos.
Entretanto, como qualquer operação jurídica, a cessão de direitos exige atenção a certos limites e cuidados, como a natureza do direito cedido, a eventual necessidade de consentimento das partes e as cláusulas restritivas que possam existir nos contratos.
Equipe Editorial Vade Mecum Brasil
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