O Estado de Sítio é uma medida excepcional prevista na Constituição Federal do Brasil de 1988, destinada a enfrentar situações de grave crise, em que as instituições normais do Estado se mostram insuficientes para garantir a ordem pública ou a integridade do país. Trata-se de uma das mais graves medidas que o Estado pode adotar, pois envolve a restrição de direitos fundamentais dos cidadãos. Abaixo, abordo os aspectos legais que fundamentam a decretação do Estado de Sítio, suas implicações e limitações.
1. Fundamentos Constitucionais
O Estado de Sítio está previsto nos artigos 137 a 141 da Constituição Federal.
Art. 137 – O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:
I – comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;
II – declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.
Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o estado de sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional decidir por maioria absoluta.
Art. 138 – O decreto do estado de sítio indicará sua duração, as normas necessárias a sua execução e as garantias constitucionais que ficarão suspensas, e, depois de publicado, o Presidente da República designará o executor das medidas específicas e as áreas abrangidas.
§ 1º – O estado de sítio, no caso do art. 137, I, não poderá ser decretado por mais de trinta dias, nem prorrogado, de cada vez, por prazo superior; no do inciso II, poderá ser decretado por todo o tempo que perdurar a guerra ou a agressão armada estrangeira.
§ 2º – Solicitada autorização para decretar o estado de sítio durante o recesso parlamentar, o Presidente do Senado Federal, de imediato, convocará extraordinariamente o Congresso Nacional para se reunir dentro de cinco dias, a fim de apreciar o ato.
§ 3º – O Congresso Nacional permanecerá em funcionamento até o término das medidas coercitivas.
Art. 139 – Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:
I – obrigação de permanência em localidade determinada;
II – detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;
III – restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei;
IV – suspensão da liberdade de reunião;
V – busca e apreensão em domicílio;
VI – intervenção nas empresas de serviços públicos;
VII – requisição de bens.
Parágrafo único. Não se inclui nas restrições do inciso III a difusão de pronunciamentos de parlamentares efetuados em suas Casas Legislativas, desde que liberada pela respectiva Mesa.
Art. 140 – A Mesa do Congresso Nacional, ouvidos os líderes partidários, designará Comissão composta de cinco de seus membros para acompanhar e fiscalizar a execução das medidas referentes ao estado de defesa e ao estado de sítio.
Art. 141 – Cessado o estado de defesa ou o estado de sítio, cessarão também seus efeitos, sem prejuízo da responsabilidade pelos ilícitos cometidos por seus executores ou agentes.
Parágrafo único. Logo que cesse o estado de defesa ou o estado de sítio, as medidas aplicadas em sua vigência serão relatadas pelo Presidente da República, em mensagem ao Congresso Nacional, com especificação e justificação das providências adotadas, com relação nominal dos atingidos e indicação das restrições aplicadas.
O artigo 137 especifica as hipóteses em que o Estado de Sítio pode ser decretado:
2. Procedimento para Decretação
A decretação do Estado de Sítio segue um rigoroso procedimento constitucional:
– Iniciativa: a competência para decretar o Estado de Sítio é do Presidente da República, que deve solicitar a autorização do Congresso Nacional;
– Consulta ao Conselho da República e ao Conselho de Defesa Nacional: antes de solicitar ao Congresso, o Presidente deve ouvir esses conselhos, que são órgãos de consulta superiores em situações de crise;
– Autorização pelo Congresso Nacional: a decretação do Estado de Sítio depende de autorização do Congresso Nacional, que deve aprovar a medida por maioria absoluta. O Congresso também fixa o prazo de duração e delimita o território em que será aplicado;
– Comunicação às autoridades internacionais: em caso de guerra, ou quando o Estado de Sítio é decretado em função de uma ameaça externa, deve-se comunicar a decisão aos organismos internacionais, conforme previsto em tratados e convenções dos quais o Brasil é signatário;
3. Efeitos e Restrições
Durante o Estado de Sítio, algumas garantias constitucionais podem ser restringidas, conforme previsto no artigo 139 da Constituição:
– Direito de reunião: pode ser limitado ou proibido, para evitar manifestações que possam agravar a crise;
– Sigilo de correspondência, comunicações telegráficas e telefônicas: pode ser suspenso, permitindo que o Estado controle comunicações que possam ameaçar a segurança pública ou nacional;
– Direito de locomoção: a liberdade de ir e vir pode ser restringida, inclusive com a possibilidade de prisão de suspeitos de envolvimento em atividades contrárias à ordem pública, desde que com fundamentos legais;
– Intervenção em entidades e requisição de bens: o Estado pode intervir em empresas e requisitar bens necessários para o enfrentamento da crise.
Contudo, há limites constitucionais para essas restrições. Não se pode, por exemplo, abolir os direitos à vida, à integridade física, ou submeter pessoas a tortura e maus-tratos, mesmo durante o Estado de Sítio.
4. Controle e Fiscalização
A fiscalização sobre a aplicação do Estado de Sítio é rigorosa. O Congresso Nacional mantém-se em sessão permanente durante todo o período de sua vigência para fiscalizar os atos do Executivo. Caso o Congresso esteja em recesso, deve ser convocado extraordinariamente.
Além disso, ao término do Estado de Sítio, o Presidente da República deve enviar um relatório detalhado ao Congresso, justificando as medidas adotadas e seus resultados.
5. Aspectos Históricos e Comparativos
Historicamente, o Estado de Sítio no Brasil tem sido decretado em momentos de grave crise política ou institucional. Exemplos incluem sua decretação durante a Revolução de 1930 e em resposta à Intentona Comunista de 1935. Esses precedentes mostram a gravidade das situações em que essa medida é adotada.
Comparativamente, o Estado de Sítio existe em outras constituições democráticas, mas sempre como medida extrema. Em países como França e Espanha, por exemplo, também se encontram previsões constitucionais semelhantes, com rígidos controles e limitações para evitar abusos.
Conclusão
O Estado de Sítio é uma medida de exceção, que revela a flexibilidade da Constituição para enfrentar situações extraordinárias, mas que deve ser aplicada com extremo rigor e controle para evitar abusos. Sua utilização implica a suspensão temporária de algumas liberdades e garantias individuais, mas sempre dentro dos limites fixados pela própria Constituição. O equilíbrio entre a necessidade de manter a ordem pública e o respeito aos direitos fundamentais é o desafio central em sua aplicação.
Equipe Editorial Vade Mecum Brasil
Publique seu artigo. Entre em contato