O quinhão hereditário refere-se à parcela da herança que cabe a cada herdeiro no processo de sucessão. No Brasil, este instituto está regulamentado principalmente pelo Código Civil de 2002, em especial nos artigos 1.784 a 2.027, que tratam do direito das sucessões. O quinhão hereditário é de extrema importância na partilha dos bens deixados pelo falecido, pois é por meio dele que se define o que caberá a cada herdeiro.
1. Natureza Jurídica
O quinhão hereditário é o resultado da divisão dos bens do espólio entre os herdeiros, após a apuração de dívidas e obrigações do falecido. Sua natureza jurídica é de direito de propriedade, pois, com a morte do de cujus, os herdeiros, desde logo, sucedem o falecido nos bens deixados, conforme o artigo 1.784 do Código Civil:
Art. 1.784 – Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.
Essa transmissão automática é conhecida como sucessão causa mortis, e ocorre de forma imediata, independentemente da vontade dos herdeiros.
2. Quinhão Legítimo e Disponível
A herança pode ser dividida em duas partes: legítima e disponível.
A legítima é a parte da herança reservada aos herdeiros necessários, que são os descendentes, ascendentes e o cônjuge. Esses herdeiros têm direito a pelo menos metade dos bens deixados pelo falecido, conforme o artigo 1.845 do Código Civil.
Art. 1.845 – São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.
A parte disponível é aquela que o testador pode dispor livremente, mediante testamento. Ela corresponde à metade da herança que não está vinculada à legítima dos herdeiros necessários.
Dessa forma, na ausência de testamento, a herança será totalmente dividida entre os herdeiros legítimos. Se houver testamento, apenas a parte disponível poderá ser destinada a terceiros.
3. Cálculo do Quinhão Hereditário
O cálculo do quinhão hereditário depende do número de herdeiros e da relação que eles têm com o falecido. Há uma hierarquia no direito sucessório brasileiro, na qual se observa a seguinte ordem:
– Descendentes (filhos, netos, bisnetos);
– Ascendentes (pais, avós);
– Cônjuge sobrevivente (que pode concorrer com os descendentes ou ascendentes);
– Colaterais (irmãos, sobrinhos, tios).
O artigo 1.829 do Código Civil estabelece a ordem da vocação hereditária. O cônjuge, por exemplo, pode concorrer com descendentes ou ascendentes, tendo direito a uma parte dos bens do falecido, variando conforme o regime de bens do casamento e a existência de descendentes comuns ou não.
4. Concorrência entre Herdeiros
Em caso de concorrência de herdeiros de classes distintas, a partilha deve seguir a proporção estabelecida por lei. Por exemplo:
No caso de descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente, se os descendentes forem comuns, o cônjuge terá direito à mesma cota que os filhos. Caso haja descendentes não comuns, o cônjuge receberá apenas 1/4 da herança (artigo 1.832).
Art. 1.832 – Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer.
Se o cônjuge concorrer com ascendentes, ele terá direito à metade da herança, se houver somente o pai ou a mãe do falecido, e a um terço, se houver ambos.
5. Direito de Acrescer
Em certas situações, pode ocorrer o direito de acrescer, que é a atribuição ao herdeiro sobrevivente da parte que caberia a outro herdeiro que renunciou à herança ou foi excluído dela. Nesse caso, a parte daquele que não participou da sucessão é distribuída proporcionalmente entre os herdeiros restantes.
6. Renúncia e Cessão de Quinhão Hereditário
O herdeiro pode optar por renunciar ao seu quinhão hereditário, hipótese em que a sua parte será redistribuída entre os outros herdeiros, como prevê o artigo 1.811 do Código Civil. Há, ainda, a possibilidade de o herdeiro ceder o seu quinhão a outro herdeiro ou a terceiro, mediante instrumento público (artigo 1.793).
Art. 1.811 – Ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante. Se, porém, ele for o único legítimo da sua classe, ou se todos os outros da mesma classe renunciarem a herança, poderão os filhos vir à sucessão, por direito próprio, e por cabeça.
Art. 1.793 – O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.
§ 1º – Os direitos, conferidos ao herdeiro em consequencia de substituição ou de direito de acrescer, presumem-se não abrangidos pela cessão feita anteriormente.
§ 2º – É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente.
§ 3º – Ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por qualquer herdeiro, de bem componente do acervo hereditário, pendente a indivisibilidade.
7. Partilha e Adjudicação
Após apurado o quinhão hereditário de cada herdeiro, realiza-se a partilha, que é o ato formal de divisão dos bens do espólio entre os sucessores. A partilha pode ser amigável, quando há acordo entre os herdeiros, ou judicial, quando há divergências. Caso um único herdeiro tenha direito à totalidade dos bens, ocorre a adjudicação.
8. Implicações Tributárias
O quinhão hereditário também envolve obrigações fiscais. Cada herdeiro é responsável pelo pagamento do Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), conforme a legislação do estado onde os bens estão situados. Este imposto incide sobre o valor total da herança, cabendo a cada herdeiro o pagamento proporcional à sua parte.
Conclusão
O quinhão hereditário é um instituto fundamental no direito das sucessões, por meio do qual se garante a divisão justa dos bens deixados pelo falecido entre seus herdeiros. Sua regulamentação no Código Civil brasileiro visa assegurar tanto a observância da vontade do falecido quanto a proteção dos direitos dos herdeiros necessários. A compreensão adequada deste instituto permite uma correta partilha dos bens, evitando litígios e desentendimentos entre os sucessores.
Equipe Editorial Vade Mecum Brasil
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