Autor(a) - Ivan Horcaio

28-08-2020 20h11

Condômino Antissocial no Condomínio - Parte I

Um dos grandes problemas de se morar em condomínio é a existência do condômino antissocial (vizinho chato, para os íntimos). O Código Civil prevê a possibilidade de multa para o condômino antissocial.

O texto do parágrafo único do artigo 1.337 do Código  trata dessa questão: 

Art. 1337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.

Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.
OBS.: contribuição para as despesas condominiais = taxa condominial e ulterior = posterior).

Minha primeira observação é que o legislador, para variar, poderia ter sido mais claro ao definir, logo no início do texto, se "condômino ou possuidor" significa inquilino ou proprietário ou se está dizendo: condômino, ou seja, o possuidor. Isso porque o condomínio não se envolve na relação locatícia e, ao multar o morador, se este for inquilino, a meu ver, estará excluindo, ao menos inicialmente, o proprietário (este sim, o condômino) do problema.

Levanto essa questão porque condômino, possuidor e proprietário são palavras sinônimas que indicam aquele que tem a propriedade do imóvel, ou seja, tem seu nome na matrícula do imóvel como responsável legal da unidade.

Superada essa questão, minha segunda observação vai no sentido de que o síndico, até decisão posterior da assembleia, está legalmente impedido de tomar qualquer outra medida judicial, o que não significa que ele não possa procurar ter uma conversa com o morador que está causando problemas.

Nesse ponto, vem uma outra questão bastante interessante. Se o, ou um dos moradores incomodados não for justamente o síndico, pode ele abordar o causador do problema sem identificar o(s) reclamante(s)? Algo assim: "olha, não vou dizer quem é, mas tem gente reclamando que você está fazendo barulho". Me parece complicado. Não é o ideal se esconder atrás do síndico. O síndico não pode se omitir, mas entendo que o reclamante também não.

Supondo que o síndico aceite esse espinhoso dever, e tem que fazê-lo, tendo essa conversa com o tal condômino antissocial somente lhe restará virar as costas, esperar e torcer para tudo dar certo.

Os problemas persistindo, ele poderá, ai sim, recorrer ao que lhe permite o Código Civil, ou seja, multar o condômino problemático em até dez vezes o valor da taxa condominial. Fácil? Não. Ele terá que tomar, por escrito, a declaração de todos os incomodados, mesmo que seja apenas um, para ter a fundamentação legal para a aplicação da multa e, na minha opinião, diferentemente do que determina o Código Civil, dar ao condômino multado a possibilidade de defesa em assembleia, sem o que, estará ele agindo sem respaldo legal, podendo ser punido civil e criminalmente pelos seu atos (e nessa hora, o morador que se escondeu vai dividir a responsabilidade?).

Claro que, no meio do caminho, pode-se recorrer a comunicações por escrito, falar com o proprietário no caso de ser o perturbador um inquilino, etc., até porque, se a coisa evoluir negativamente, quem vai sofrer as consequências é o proprietário, mas, mesmo assim, ao se tratar com o proprietário, seja ele o morador ou não, em termos mais definitivos, o síndico não pode fazê-lo sem o respaldo de documentação.

É fácil imaginar, como exemplo, a ineficácia de alguém ir numa delegacia e querer fazer um boletim de ocorrência sem querer se identificar. Se o morador incomodado deseja que o síndico haja por ele, deve municiá-lo de documentos que lhe deem poder de agir, mas, mesmo assim, o poder de agir do síndico é limitado, por não ser ele o titular do direito violado.

Finalmente, sempre lembro que o síndico jamais pode tomar partido, devendo assumir uma posição neutra, procurando com isso estar sempre do lado de quem está certo, não procurando definir quem é antes de levantados todos os fundamentos.

Sou da opinião da necessidade de se buscar soluções mais drásticas para o problema do condômino antissocial, tais como a sua exclusão ou afastamento do convívio condominial, pois até mesmo já existe uma discreta inclinação da jurisprudência nesse sentido, mas é, como em toda medida judicial, um processo lento.
 

Atenção: o conteúdo desta publicação, bem como as ideias apresentadas, não representam necessariamente a opinião desta coluna, sendo de inteira responsabilidade de seu autor.

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Ivan Horcaio

Advogado. Autor de várias obras jurídica, notadamente de dicionários jurídicos, e também nas áreas de concursos públicos e Exame de Ordem. Foi editor chefe de conhecida editora jurídica, tento trabalhado na elaboração, edição e publicação de dezenas obras, sendo o organizador do vade mecum dessa editora por seis anos. Diretor de conteúdo do site Vade Mecum Brasil.




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