Autor(a) - Daniel Dezontini

29-05-2020 12h12

Franquia: è correto Efetuar o Protesto de Boletos Bancários Referentes aos ROYALTIES?

Os integrantes da relação de franquia, em sua quase totalidade, não sabem se é válido ou não levar a protesto boletos bancários referentes aos royalties quando estes não são pagos no vencimento.

A conduta mais comum que se observa no dia a dia desse sistema de negócio é o franqueador emitir boletos bancários, em substituição de duplicatas, para efetuar a cobrança de royalties e depois protestá-los em caso de não ocorrer o tempestivo pagamento pelo franqueado.

A partir disto, surge a polêmica se tal prática é ou não legal.

Os boletos bancários são, exceto algumas restrições destacadas pelos mais renomados estudiosos do direito, considerados “duplicatas virtuais”, e nesse sentido já foram expressamente reconhecidos pelo artigo 889, parágrafo 3º, do Código Civil que em suma diz que “o título pode ser emitido a partir dos caracteres criados em computador ou meio técnico equivalente e que constem da escrituração do emitente“.

Art. 889. Deve o título de crédito conter a data da emissão, a indicação precisa dos direitos que confere, e a assinatura do emitente.

...................................

§ 3º - O título poderá ser emitido a partir dos caracteres criados em computador ou meio técnico equivalente e que constem da escrituração do emitente, observados os requisitos mínimos previstos neste artigo.

Por conseqüência, pode-se até mesmo afirmar que os boletos bancários se situam hoje em dia dentre os documentos representativos dos títulos de crédito e, exatamente por conta disso, muitas pessoas acreditam ser possível emiti-los para qualquer tipo de hipótese em substituição às duplicatas, mediante mera indicação do credor por meio magnético ou de gravação eletrônica de dados.

No entanto, tem-se considerado ilegal a conduta de emitir boletos bancários, em substituição às duplicatas, especificamente para a cobrança de royalties e depois levá-los a protesto quando não há o pagamento tempestivo.

É que, por ser um título causal, a duplicata somente pode ser emitida para representar um crédito decorrente de uma determinada causa prevista em lei, e não da simples vontade das partes interessadas, lei essa que é clara no sentido de que a duplicata apenas pode ser emitida em caso de COMPRA E VENDA MERCANTIL ou PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS.

Assim, tendo em vista que o contrato de franquia não consta do rol da Lei n° 5.474/68 (Lei das Duplicatas), não é legal emitir o boleto bancário, em substituição à duplicata, para a cobrança de royalties e depois protestá-lo em caso de inadimplemento.

É o que preveem os artigos 1º e 20 da referida Lei 5.474/68, que dizem:

Art. 1º - Em todo o contrato de compra e venda mercantil entre partes domiciliadas no território brasileiro, com prazo não inferior a 30 (trinta) dias, contado da data da entrega ou despacho das mercadorias, o vendedor extrairá a respectiva fatura para apresentação ao comprador.

Art. 20. As empresas, individuais ou coletivas, fundações ou sociedades civis, que se dediquem à prestação de serviços, poderão, também, na forma desta lei, emitir fatura e duplicata.

E não há mesmo como ser diferente, pois o contrato de franquia é realmente muito mais abrangente do que um simples contrato de compra e venda de mercadorias, ou de prestação de serviços, como bem indica o próprio conceito de franquia trazido pelo art. 2º da Lei 8.955/94 (Lei de Franquia) que revela que esse sistema de negócio costuma envolver:

- o direito de uso de marca;

- o direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços; e

- o direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio.

Sobre o assunto, o Judiciário nacional já há algum tempo firmou entendimento de que é possível a declaração de nulidade de tais títulos e a sustação dos protestos de boletos bancários, emitidos em substituição às duplicatas e em função de royalties ou de outros contratos não mercantis, bem como a reparação dos danos morais oriundos desta ilegalidade:

Ação declaratória de inexigibilidade de título. Duplicata mercantil. Alegação de ausência de causa subjacente. Réu apelante sustenta o saque da duplicata para cobrança de royalties devidos em razão de contrato de fornecimento de produtos têxteis com utilização de marcas de times de futebol licenciadas pela ré. Incabível a cobrança de royalties por meio de duplicata mercantil dada a natureza causal do título, sendo possível o saque resultante de compra e venda mercantil ou prestação de serviço. Inteligência da Lei nº 5.474/68. Inexigibilidade da duplicata. Danos morais evidenciados em razão do protesto ilícito da duplicata mercantil. Sentença mantida. Recurso negado. (TJ-SP – Apelação nº 0021023-57.2011.8.26.0344, 13ª Câmara de Direito Privado. Relator: Francisco Giaquinto, Data de Julgamento: 03/09/2014, Publicado em 08/09/2014).

NULIDADE DA SENTENÇA. Ausência de fundamentação. Inocorrência Sentença que analisou adequadamente os pontos relevantes para o deslinde da controvérsia. Ausência de afronta ao artigo 93, IX, da CF e artigo 458, II, do CPC Preliminar rejeitada. DECLARATÓRIA. Duplicata Mercantil por indicação. Duplicata emitida para cobrança de “Royalties”. Inexistência de relação cambiária para justificar a emissão de duplicata para cobrança de royalties. Titulo inexigível. Sentença de procedência parcial. Aplicação do art. 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça. Sentença mantida. Apelo improvido. Dispositivo: negam provimento ao recurso. (TJ-SP – Apelação nº 1003160-18.2014.8.26.0554, 19ª Câmara de Direito Privado. Relator: Ricardo Negrão, Data de Julgamento: 09/11/2015, Publicado em 26/11/2015).

Com efeito, como não há permissão legal para emitir duplicata mercantil, ou boleto bancário em substituição desta, no tocante aos royalties, muito menos para efetuar o protesto de tal título, recomenda-se ao franqueador, a fim de não vir a ter problemas jurídicos, socorrer-se de outro caminho para validamente cobrar o franqueado.

Atenção: o conteúdo desta publicação, bem como as ideias apresentadas, não representam necessariamente a opinião desta coluna, sendo de inteira responsabilidade de seu autor.

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Daniel Dezontini

Advogado. Pós-graduado em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Especialista em Direito Contratual pelo Centro de Extensão Universitária (CEU). Sócio fundador do escritório Dezontini Sociedade de Advogados. Atuação destacada em Direito Civil, Direito Empresarial, Direito do Consumidor, Direito Contratual, Propriedade Intelectual, Direito Trabalhista e Franchising.




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