Perda do Poder Familiar

A perda do poder familiar, também conhecida como perda do poder parental ou destituição do poder familiar, refere-se à cessação dos direitos e deveres dos pais em relação aos seus filhos menores. No Brasil, o poder familiar é regulado pelo Código Civil (Lei 10.406/02) e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei 8.069/90), que estabelecem as condições em que os pais podem ser destituídos de seu poder familiar. Esta medida é considerada extrema e visa, principalmente, proteger o interesse superior da criança e do adolescente.

1. Definição e Natureza do Poder Familiar

O poder familiar é um conjunto de direitos e deveres conferidos aos pais no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores. Segundo o Código Civil Brasileiro, o poder familiar é exercido igualmente pelo pai e pela mãe, e se destina a proporcionar o desenvolvimento integral do filho, assegurando-lhe sustento, guarda, educação e convivência familiar.

1.1. Características do Poder Familiar

O poder familiar é:

Irrenunciável: os pais não podem abdicar voluntariamente de seus deveres e responsabilidades em relação aos filhos;

Inalienável: não pode ser transferido para terceiros, exceto em casos previstos em lei;

Imprescritível: Não se extingue pelo não exercício ao longo do tempo.

2. Motivos para a Perda do Poder Familiar

A perda do poder familiar ocorre por decisão judicial quando os pais cometem atos que violam os direitos da criança e do adolescente, comprometendo seu desenvolvimento e bem-estar. De acordo com o artigo 1.638 do Código Civil Brasileiro, são causas para a perda do poder familiar:

– Abandono: Quando os pais deixam de prover as necessidades básicas do filho, como alimentação, saúde, educação e moradia;

– Práticas de maus-tratos, abuso de autoridade ou omissão grave: Envolve agressões físicas ou psicológicas, negligência ou descaso em relação aos cuidados básicos da criança ou adolescente;

– Conduta moralmente reprovável: Situações onde os pais mantêm comportamentos que comprometem a moralidade e a educação da criança, como envolvimento com criminalidade ou uso de drogas;

– Entrega irregular do filho a terceiros: Quando os pais entregam o filho a outra pessoa ou instituição sem autorização judicial, seja por abandono ou por qualquer outra razão que não esteja amparada pela lei;

– Violação dos deveres inerentes ao poder familiar: Inclui qualquer conduta que contrarie os deveres estabelecidos pela lei, como a obrigação de sustento, guarda e educação dos filhos.

Art. 1.638 – Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:

I – castigar imoderadamente o filho;

II – deixar o filho em abandono;

III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;

IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

V – entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção.

Parágrafo único. Perderá também por ato judicial o poder familiar aquele que:

I – praticar contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar

a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher;

b) estupro ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão;

II – praticar contra filho, filha ou outro descendente:

a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher;

b) estupro, estupro de vulnerável ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão.

De acordo com o artigo 101 do Lei 8.069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, somente pode haver destituição do Poder Familiar após terem sido esgotadas todas as medidas de apoio aos pais da criança/adolescente e ficar comprovada a impossibilidade de reintegração familiar, com a família de origem ou extensa.

Art. 101 – Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:

……………………..

§ 9º – Em sendo constatada a impossibilidade de reintegração da criança ou do adolescente à família de origem, após seu encaminhamento a programas oficiais ou comunitários de orientação, apoio e promoção social, será enviado relatório fundamentado ao Ministério Público, no qual conste a descrição pormenorizada das providências tomadas e a expressa recomendação, subscrita pelos técnicos da entidade ou responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar, para a destituição do poder familiar, ou destituição de tutela ou guarda. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência

§ 10.  Recebido o relatório, o Ministério Público terá o prazo de 15 (quinze) dias para o ingresso com a ação de destituição do poder familiar, salvo se entender necessária a realização de estudos complementares ou de outras providências indispensáveis ao ajuizamento da demanda.

……………………

3. Procedimento para a Perda do Poder Familiar

A destituição do poder familiar é uma medida judicial que exige um processo legal, onde são observados os princípios do contraditório e da ampla defesa. Esse processo pode ser iniciado pelo Ministério Público ou por qualquer pessoa que tenha conhecimento da situação de risco em que a criança ou adolescente se encontra.

3.1. Tramitação do Processo

– Propositura da Ação: a ação de destituição do poder familiar é proposta perante o juízo da Vara da Infância e Juventude ou Vara Cível, dependendo do local;

– Instrução Processual: durante o processo, são colhidas provas, depoimentos de testemunhas, relatórios de assistência social, psicólogos, entre outros elementos que possam auxiliar na decisão;

– Decisão Judicial: o juiz decide pela perda ou não do poder familiar, sempre com base no interesse superior da criança e do adolescente.

3.2. Direito de Defesa

Os pais têm o direito de se defender e de apresentar provas contrárias às acusações que lhes são imputadas. O contraditório e a ampla defesa são princípios constitucionais que garantem um julgamento justo e equilibrado.

4. Consequências da Perda do Poder Familiar

A perda do poder familiar tem como principal consequência a retirada do direito dos pais de exercerem os direitos e deveres em relação aos filhos. Isso implica na perda da guarda, do direito de decidir sobre a educação, saúde e outros aspectos da vida da criança. A criança ou adolescente poderá ser encaminhada para adoção, guarda ou tutela por terceiros, dependendo do caso.

Além disso, a perda do poder familiar não isenta os pais das responsabilidades econômicas, ou seja, eles continuam obrigados a prover alimentos aos filhos, se necessário.

5. Reversão da Perda do Poder Familiar

A reversão da perda do poder familiar é uma possibilidade legal, desde que sejam comprovadas mudanças substanciais e efetivas na conduta dos pais e no ambiente familiar que motivou a perda do poder. O pedido de reversão deve ser dirigido ao mesmo juízo que decretou a destituição, sendo igualmente necessário um processo judicial que analise a conveniência e os interesses do menor.

Conclusão

A perda do poder familiar é uma medida excepcional, adotada apenas em situações graves que coloquem em risco o bem-estar e o desenvolvimento de uma criança ou adolescente. Embora seja uma medida drástica, é fundamental para garantir a proteção integral de menores, assegurando que cresçam em um ambiente seguro e saudável. O sistema jurídico brasileiro busca sempre equilibrar os direitos dos pais e o dever de proteger os interesses da criança, priorizando o seu desenvolvimento físico, mental e emocional.

Equipe Editorial Vade Mecum Brasil

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